O segredo dos meus olhos

Outra noite, ao tentar dormir, não parava de pensar em rugas. Ficava vindo o seguinte pensamento: “rugas entregam a idade de uma pessoa. Entregam, mas também enganam. As rugas entregam o que cada um julga ser ‘idade’. Esquecem que rugas contém emoções, quer sejam elas ruins ou boas. Rir também pode dar rugas, pois alegria se marca na gente. Felicidade nos marca como ferro. Queima mesmo, arde. E a prova disso fica registrada em forma de pequenas e, dependendo do tamanho do sentimento, profundas rugas.”

Aí, inquieta com estes pensamentos na cama, pensei em descer e escrever algo a respeito da vida, das rugas que venho observando a cada dia aparecerem em mim. Começaram tímidas, lentas. Mas todas, independente de quando vinham, chegavam com força. As minhas são profundas. Julguei-me então uma pessoa cheia de história e estórias pra contar. Emocionei-me com as minhas próprias emoções. Ali, deitada, não desci para escrever nada. Virei-me de lado, com a mão direita embaixo do travesseiro e, eventualmente, dormi. Acordei querendo relembrar o que tinha pensado, recordar as frases que pareciam perfeitas para um post e mordi o lábio com certa raiva por não ter escrito nada, nem no bloquinho ao meu lado que deixo no criado-mudo justamente para estes momentos…

Esta noite revi um filme que mexeu muito comigo quando assisti. Não faz muito tempo, pouco mais de um ano talvez. Surpreendeu-me o quanto ele ainda mexe e, quase com certeza, mexerá a cada vez que o assistir de novo em qualquer futuro. Filme argentino com excelente elenco, enredo baseado em praticamente todas das mais importantes emoções humanas, diálogos inesquecíveis e, como não poderia deixar de ser, marcantes. Quando o filme acabou, permaneci sentada no sofá, pensando… Engraçado que, no filme, os atores principais pensam demasiado. Também sentem bastante, mas pensam mais. E o coadjuvante aconselha sabiamente ao ator principal para que este não pense mais. O diz para esquecer, senão ele viverá com “mil passados e nenhum futuro”. O ator central guardava, carregava em sua vida a marca pesada de um arrependimento. Passados 25 anos na estória/história, ele questiona como “alguém consegue viver uma vida cheia de nada”.

Xeque.

Como pode mesmo, fiquei indagando dentro da minha cabeça. “Será que esta pessoa que vive a vida cheia de nada tem alguma ruga?” Será o meu nada o mesmo que para o outro? Valem alguma coisa as minhas rugas para qualquer outra pessoa? Quem as entende, senão eu mesma? E será que até eu consigo entender corretamente o porquê de cada uma e como elas vieram parar aqui? Não suporto a ideia de olhar para minha vida em qualquer momento que seja e pensar no que e em como gastei meu tempo. Quero tê-lo investido.

Bingo.

Para quem assistiu ao filme, o meu “temo” não é muito diferente do dele. Também temo. Mas eu fiz minha letra “A” funcionar. Dentro de mim mesma. Registrei isso para que minhas rugas venham. E que venham com força. Tão fortes quanto o sentimento do “te(a)mo” pode ser. Porque só quem teme, ama. Só quem ama, vive. E não quero esperar que se passem anos, muito menos 25 deles, para me dar conta que não estou com todas as rugas que poderia estar. E longe de mim querer escondê-las.

Xeque-mate.

Ou… sendo literal: o segredo dos meus olhos…

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6 Comments Add yours

  1. Od says:

    Lindo post, Ju. Me emocionei, fiquei arrepiado. Viajei na leitura junto com você e pensei na minha própria vida, no que já fiz, no que pretendo fazer. Tenho pensado mais no futuro que no passado, mas me sinto feliz em reviver. Hoje mesmo estive vendo umas fotos com o Alec, coisa que raramente fazemos. Me dei conta que já vão fazer 3 anos que fomos para Disney pela última vez. Life goes on, and I’m certainly happy about who I am, but most of all, with whom I am planning to be, and I WILL. I’m 100% sure that you will too. Este é meu maior desejo e sei que nós vamos ainda ter muitos momentos de plena felicidade, e ainda muitas rugas pra comemorar.
    Um super beijo e parabéns mais uma vez. Você continua afiada como sempre, só melhorando. 🙂

  2. Me - Litz says:

    Danke, dear – du weist es gar nicht aber du hast mir viel geholfen ;-))
    Vor 10 minuten verging die Zeit einfach nicht, und jetzt geniesse ich sie waerend ich “dich” lese.

  3. Angela says:

    Que lindo, Ju! Estou aqui pensando quantas de minhas rugas foram de “investimento”… É uma lição a sábia e deliciosa forma de encarar a idade: acúmulo de experiências, preenchimento dos vazios, liberação dos medos, vivência total dos melhores sentimentos. Parabéns, keep up the great work! BEIJOS! Mumily

  4. Lidiane says:

    Queriiida,

    Fazia tempo que não passava por aqui…Mas bastam poucas palavras para eu recordar a amiga sensível e observadora que tenho!

    Saudade…todas!

    Ah! Certamente alguma das minhas rugas v. ajudou construir…:-)

  5. Ana says:

    Piração esse texto hein Ju??!!! Adorei e adoro o filme!!! Já que temos que nos esforçar pra não pensar tanto, posso ficar com aqueles minutinhos de lembrar das rugas onde passo o creme para a area dos olhos, pro dia e pra noite…rs! : P

  6. says:

    Ai, ainda bem que pessoas como você conseguem trazer poesia pra algo que a sociedade resolveu chutar.
    Vou começar a comemorar os aniversários das minhas rugas. Porque elas valem cada traço marcado.

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