É uma chateação. Ou não. Questiono se é. Duvido se não é. Duvido e questiono porque posso. Alguns dizem que sou muito importante e, para uns, até vital. Mas, honestamente, me sinto, ou melhor, nos sentimos, chateados. Aliás, desculpem-me: falei em nome do meu parceiro, coloquei a frase no plural, mas não posso falar por ele, pois ele é mudo. Logo, não sei ao certo como se sente. Só falei o que imagino (e quase sinto que sei) que ele também quase sinta, pois deve ser muito parecido com os meus sentimentos.

Mas por que uma chateação? Pois sou constantemente exigido. Não me dão nenhuma trégua. Trabalho 24 horas por dia, 7 dias por semana e ainda se sentem no direito de ficarem me cutucando. Entra muita coisa em mim. Sai pouca. Aliás, quase nada. Como podem ver, é difícil. A equação é desequilibrada.

Sinto que ajudo a formar personalidades das pessoas. Na realidade, acho que as formo de verdade. Já pensaram no peso que isso me traz? Que grande responsabilidade!
Gostaria de ter mais autonomia, mas nasci sem filtro… tenho pouca ação.
Ironicamente, aqueles que nasceram desprovidos de mim ou de minha habilidade, são aqueles que nasceram com o tal filtro! E, sim, formo a personalidade deles também.
Será uma benção? Ou uma maldição. Ambos, talvez. Não sei dizer.

E, novamente, quem me tem, me cutuca! Como se já não bastasse o volume de coisas que me adentram dia sim e dia sim novamente, ainda me cutucam! Não interessa muito se com o dedo, com texturas, com maciez, com cuidado, com pontas ou com força. É chato isso! Mas também é bom.

Cansa, mas me faz me sentir também mais perto do viver.
Em suma, sou muito parecido com a vida: cansa, mas vale a pena.

(quem sou eu? usem a imaginação e lembrem-se… sou um espacinho…)