…ensanguentada com líquido de gosto seco, toma agora cor vermelha exagerada e se remexe em pequenos saltinhos involuntários, criados pelo arredondado, mas de certa forma pontiagudo aparelho que habita a boca desta que lhe escreve. O mesmo fisgou minha língua e a coitada não pôde soltar-se com a delicadeza exigida para tal situação. Em pânico, sentindo-se presa, optou pela força. Força esta que tornou-se contra si mesma, rasgando-a horizontalmente, deixando vazar o líquido. Agora o gosto ocupa toda a minha boca e até o céu dela reza por piedade. Aos poucos a língua se acalma e volta a posicionar-se lentamente no canto que lhe foi deixado, pois o aparelho que chegou é um intruso e, pior, um intruso folgado. Chegou sem avisar e tomou conta do espaço que a língua ocupara há quase 35 anos (a serem completados em exatos 4 dias). Um abusado. De maneira estranha, assim como é a vida, ambos possuem um laço que os une. Eu. Novamente aquela que lhe escreve. Por dedicação, se esforçam para que, em conjunto, eu me sinta melhor das dores que sinto nesta região física. E este triângulo língua-aparelho-ser usa o elemento onde tudo acontece, a minha boca, para sorrir-lhe e dar-lhe um beijo de despedida.