A vida como ela é (para ela)

Eu os conheci em situação nada convencional: estava voltando de uma viagem internacional de negócios, daquelas que mal paramos para fazer um intervalo biológico, com um recém paquera me mandando vários emails de que queria que fosse com ele numa festa toda especial. Teria que comprar o ingresso e, no meio de tanta apresentação e reunião, mandei somente um email direto dizendo que queria ir, mas que estava sem condições de ver nada a respeito. Se ele quisesse, que visse para mim e eu o pagaria depois. Pronto. Dito e feito. Homem, às vezes, gosta de ser pau mandado. Então, ele me pegou e fomos à tal festa.

Lá chegando, o perdido do paquera se deu conta que havia comprado ingresso errado, pois os amigos estavam na área VIP e, nós chulés, na área normal. Nada que a compra de um upgrade não resolveu na hora. E que upgrade. Acabei, por conta deste up no ingresso, conhecendo a pessoa de quem vou falar neste relato. Uma das minhas maiores e melhores amigas. Sua altura não é proporcional ao tamanho do seu coração. Aliás, não entendo como ela não tomba para frente (ou seria para a esquerda?) a cada passo que dá. Como eu era a “nova” do pedaço, todos era também novos para mim. Cumprimentei a todos com meu costumeiro sorriso super simpático e, ao que dizem, charmoso. Com ela não foi exceção, até porque reparei que um rapaz alto e forte a abraçava pela cintura como se não quisesse ou pudesse soltá-la. Na hora não pensei nada, simplesmente os cumprimentei e, ao acompanhar o trajeto da música vindo dos alto falantes até meus ouvidos de forma tão viva e empolgante, me direcionei alguns passos à frente e coloquei meu esqueleto a dançar. Depois desta festa, não sei como e nem o porquê, mas nos tornamos inseparáveis. Inexplicável é assim. É porque é. E quem vai discutir?

E quem vai discutir coisas do coração? Este conto não se trata da minha amizade com ela, mas sim sobre ela mesma e, eventualmente, do caso de amor, intriga, paixão, ciúmes, expectativas, aprendizados, dúvidas, certezas, pausas, fogo, inquietação e suspiros dela com o ex-tudo isso da vida dela. Quem discute assuntos do coração… Sábio aquele que não o faz. Esperto quem vive essas coisas. Ressabiado aquele que tenta entender. Convencional quem não pergunta. E inteligente mesmo quem se entrega. E minha amiga foi inteligente. Se entregou. Antes disso, passou por todas as fases de sabedoria, convencionalidades, pé atrás. Mas no fim, deu um pulo no negócio para não morrer com a dúvida do “e se?”. Além de não ter morrido, está mais viva do que nunca – ironicamente, não está mais com ele. E agora, quero ver, quem também ousa discutir a vida em si? A vida, vasta e avassaladora, morna e quieta, pulsante e simplesmente viva como é. É grande demais para ser discutida: ela pede par ser vivida. Só isso. Felizardo de quem entende isso. De novo: minha amiga é assim.

Foram 2 anos (e meio?) de relacionamento com aquele que não mais faz parte da vida dela. Houve momentos de alegria intensa, de certeza absoluta de que não era ele o cara para ela e nem ela mesma a mulher certa para ele, mas isso passava assim que se encontravam e se derretiam um dentro do outro. O abraço forte, quase esmagador, dele era uma descrição ao vivo e a cores da frase “não quero te soltar nunca mais”. Houve crises, sorrisos, desabafos (comigo), sentimentos esperançosos, momentos “ladeira abaixo”. E houve festa, muita festa. Nas festas era tudo lindo, amor intenso, olhos brilhando, sorrisos que delatavam tudo ali guardado do lado esquerdo do peito. Do lado dele, havia um castelo ali no lugar do coração: ele a colocara no posto mais alto da torre para guardá-la bem, mas ele mesmo esquecia de onde guardara a chave de vez em quando e não conseguia acessá-la sempre. Do lado esquerdo dela, havia carbono: poderia permanecer um simples elemento químico ou transformar-se em elemento precioso. Por vezes, ele soube ver isso: era quando a visitava por horas, dias a fio no alto de sua torre, no canto mais guardado do castelo. Outras vezes, ele parecia havê-la esquecido lá em cima enquanto ele se escondida em algum outro lugar recôndito do castelo. Quando a primeira opção acontecia, ela tornava-se diamante. Quando da segunda, carbono. O mais estranho foi ela própria ter deixado esquecer-se de que sempre havia sido diamante. Já havia sido lapidada e cristalizada por pessoas passadas. Esquecera-se também que o diamante não pode, pela sua própria natureza, ser riscado por nenhum outro mineral ou substância, exceto pelo próprio diamante. Seria ele então, o ex-tudo isso que conseguiu riscá-la, um outro diamante? Seria ele apenas um diamante de cor mais escura e, ouso até dizer, menos atrativo aos olhos externos? Haveria ele já se convertido em grafite e esquecido de ser, tornar-se um diamante, se assim o quisesse (como ela também o queria)?

Seja de que forma for, não sei responder sobre ele. Mas sei bem que ela é assim: um diamante. E, mesmo quando riscada, ficou mais forte que nunca. Mais bonita, mais cristalizada. Suas esferas e formas reagem a cada temperatura nela aplicada. E, diferente do que se pensou durante anos, os diamantes não são eternos, pois o carbono definha com o tempo (entra aqui a definição do ex-tudo isso?), mas os diamantes duram mais que qualquer ser humano.

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