Juro que o relato que se segue é real. Sei que pode ser bem complicado de acreditarem, mas eu preciso deixar claro que assim foi, que tudo exatamente assim se deu. Não sei como fazer com que seja crível e que não deixe nenhuma dúvida o que aqui vou contar, mas prometo que vou tentar. Espero dar certo. Espero mesmo. De verdade, pois a realidade precisa ser dita tal como ela pede para que a vejam e a engulam: nua e crua. Talvez justamente por ela, a verdade, demandar isso é que fique tão difícil de conceder tamanha exigência com tanta precisão. Gera pressão, ansiedade, vergonha de errar, medo de não ser fidedigno o suficiente e nem merecedor deste papel. Até aí, deve ser este o motivo pelo qual aceitei tal desafio. Não só por isso, mas também pela carga elétrica que é disparada dentro de mim só de lembrar do fato. Não que tenha sido nada tão aterrorizante quanto minhas palavras soam, mas tampouco posso afirmar que tenha sido algo simples. Marcante certamente foi, isso posso concluir com mais de 100% de certeza e falo por todos os ali então presentes, sem haver necessidade de consultá-los. Éramos 3 quando tudo ocorreu e agora somos só 2, pois um de nós morreu. O outro jurou calar-se de tal modo que até de surdo se faz. Se não se escuta, não se fala e também não se fala sobre o que não se escuta (muito menos ainda sobre aquilo que jurou apagar dos seus olhos). O episódio marcou cada um de nós e nossas vidas: agora restaria saber o que ficou em cada, qual o registro deixado, mas isso, sinto muito, não tenho como compartilhar. Nunca há duas percepções iguais sobre o mesmo acontecimento quando visto por duas ou mais óticas distintas. Seria bem mais imparcial e até bem menos possível de acreditar no que hei de confessar em breve se o trio restante também compartilhasse de suas impressões. Falei sobre 3 pessoas, mas havia 4 no ato. O estranho é que com o relato deste 4o. componente eu jamais poderia contar. Trata-se de vítima e executora ao mesmo tempo. Ah, agora ficou mais intrigante, certo? O interesse por fatos estranhos e desconhecidos acompanha a humanidade desde sempre. Nos move, nos atiça, deixa a adrenalina ser livre e nos ilumina pro fato de que, quando optamos ficar pra ver o que vai acontecer, escolhemos sentar na linha tênue entre prazer e dor. Naquele dia percebi que temos mais medo de não querer ofender a alguém do que o medo de possível dor. Logo, os 3 optaram por ser educados. E agora sinto-me só nestas linhas. Assim sendo, sobrou quem pra contar? Eu. E para quem foi deixada a responsabilidade de, quem sabe um dia, contar tudo na íntegra, tim-tim por tim-tim? A mim. E quem seria o único capaz de decidir que, na verdade, não era de fato capaz de contar nada?